Durante muitos anos serviram as duas margens do Tejo, navegando ora rio acima ora rio abaixo para transportar, principalmente, mercadorias. Hoje em dia, as embarcações tradicionais do Tejo são, por consecutiva preservação da Câmara Municipal do Seixal, o museu vivo capaz de (re)contar a história do concelho e das gentes do Seixal.
A NiS viveu essa experiência ao embarcar no Bote Fragata Baía do Seixal na passada quinta-feira, 14 de julho. Além do passeio pelas águas do Tejo, descobrimos toda a história do Moinho de Maré de Corroios. O passeio aconteceu num dia quente de verão. Os termómetros ultrapassavam claramente os 30 graus e a pouca aragem que corria sentia-se quente. Foram mais de duas horas de experiência que, desde já, recomendamos a todos, quer sejam seixalenses ou visitantes deste concelho.
Com a ajuda de dois membros da tripulação, todos os passageiros subiram a bordo. Já instalados nos seus lugares, a voz de Carla Ribeiro, técnica do Gabinete de Desenvolvimento Económico e de Turismo da Câmara Municipal do Seixal, começou a ouvir-se vinda de perto da proa do barco. Esta figura faria assim, de forma completamente irrepreensível, o acompanhamento de toda a experiência.
Sem mais demoras, chegou a hora de começarmos a viagem. A embarcação destacava-se pela sua serena imponência. Neste momento, é a segunda embarcação do Tejo mais antiga a navegar. Noutros tempos, servia de transporte de carga de produtos e bens da Margem Sul para a capital, Lisboa, e vice-versa. Era comum circularem nestes botes cereais, vinho e azeite.

Numa total readaptação, naquele dia pudemos ver o Baía do Seixal a servir igualmente as populações, mas num âmbito turístico. O cheiro a maresia entranhava-se de todos os lados e a calmaria que o mesmo transmitia a cada légua navegada, por si só, já fazia aquele momento valer a pena. Estavam cerca de 40 pessoas a bordo, entre miúdos e adultos, e todas elas pareciam estar a aproveitar aquela experiência única.
Entre elas estava o vice-presidente da Câmara Municipal do Seixal, Paulo Silva, com quem tivemos oportunidade de conversar. “As embarcações tradicionais do Tejo são um património de todas as populações que usufruem deste rio maravilhoso que é o Tejo. Fazem parte da história coletiva”, começa por explicar.
“Temos um programa de passeios pela nossa Baía que está disponível para toda a população e que a mesma usufrui porque nós queremos que a Baía seja um usufruto de todos e, por isso, utilizando estas embarcações tradicionais permitimos que a população visite a nossa Baía para ver como é bonito o nosso concelho, a Amora, a Arrentela, o Seixal, de dentro da Baía. Não queremos que a Baía seja só para alguns, queremos que seja para todos”, reforçou ainda.
Ainda em entrevista à NiS, o autarca seixalense relembrou que o Seixal tem, historicamente, uma grande ligação ao mar, ao Tejo e à sua Baía. E é justamente por isso que a autarquia tem o objetivo de preservar aquela que um dia foi a sua história.
“De início era feito o transporte fluvial dos produtos agrícolas que eram cultivados no Seixal para a cidade de Lisboa. Depois, houve uma grande ligação ao mar através da pesca. Nos anos 40 do século passado, o Seixal tinha uma das maiores frotas de pesca de bacalhau do País. Inerente a estas atividades começou a desenvolver-se a indústria da construção e da reparação naval, que também faz parte da nossa história. Há quem diga que as naus que foram para a Índia, de Paulo da Gama e de Vasco da Gama foram construídas aqui no Seixal”, revela por fim Paulo Silva.
Entre conversas, a serenidade do Tejo, a observação da viva fauna e da flora envolvente, acabámos por atracar no Moinho de Maré de Corroios. Aí a história foi outra. Mas não desespere, porque a New in Seixal vai contar-lhe tudo.
A visita ao Moinho de Maré de Corroios
Logo à entrada, o edifício desperta facilmente a atenção de todos — nem que seja pela estranheza e novidade. Afinal, já lá vai o tempo em que era necessário ter estes engenhos a funcionar para que fosse possível chegar à nossa mesa bens essenciais, como o pão. O facto de a vida se ter tornado muito citadina também vem contribuir para que a maioria das pessoas descubra, para além dos livros da história, o que eram estas instalações que faziam parte do quotidiano dos portugueses.

O Moinho de Maré de Corroios data de 1403. Durante muitos anos pertenceu à Igreja e no século XIX, mais precisamente em 1834, passou a fazer parte da fazenda pública. Depois chegaram os privados, que a título individual exploraram as funcionalidades deste edifício seixalense. Em 1986, transformou-se num núcleo museológico e foi a partir daí que se tornou num espaço de visitas recorrentes. Por essa altura, era um dos locais turísticos mais visitados da Península de Setúbal.
Uma vez atravessada a entrada do moinho, onde todos os participantes da experiência ouviam atentamente as palavras de Carla Ribeiro, que explicava na sua generalidade os factos históricos do equipamento, chegamos ao espaço mais importante do moinho e onde tudo, em tempos, acontecia.
Observámos as ferramentas utilizadas pelos moleiros e ficámos a saber tudo sobre os próprios processos de trabalho. De uma forma bastante resumida, o cereal chegava de barco — no avançar da história também foi transportado de carroça e, mais tarde, por transporte rodoviário — e era descarregado. Procedia-se à primeira limpeza do cereal e depois o maior trabalho era entregue às mós, a força motriz para todo o moinho funcionar. Mas não só.
Este é um moinho especial, já que só seria possível funcionar assim que a maré estivesse baixa e sem água. Era importante, em primeiro lugar, que a maré enchesse para que a caldeira do moinho ficasse atolada de água. Não havia, para isso, qualquer intervenção humana. Era apenas preciso esperar que a caldeira enchesse.
Para isso, o pejadouro do moinho teria de abrir as portas para que a água o atravessasse, fazendo a mesma entrar e tocar nas palhetas do rodízio. A água, com o descer da maré, começaria a sair e as pás instantaneamente a moverem-se. Era assim que a força chegava à mó e o cereal era depois transformado.
Dentro da instalação, com este processo a decorrer, o moleiro enchia o taigão de cereal e o desfecho já possivelmente está a adivinhar: saía a farinha. Mas o trabalho não se ficava por aí. Era ainda necessário peneirar, isto é, remover as cascas da farinha com a peneira. Entre os cereais mais utilizados estavam o trigo, o centeio e o milho.
Durante a visita, houve ainda a oportunidade de conhecer a área envolvente do Moinho de Maré de Corroios. Bem perto encontra-se o Sapal de Corroios: uma zona húmida no Seixal conhecida pela sua riqueza de espécies, que vão desde a tainha ao choco, robalo, enguia, entre outros. A mesma zona é igualmente de eleição para dezenas de aves migradoras, que vêm do norte da Europa, e que tantas vezes podem ser ali avistadas.
O regresso ao Seixal
É precisamente sobre a fauna e a flora que, assim que entrámos no Bote Fragata Baía do Seixal, se ouve Carla Ribeiro falar. A visita, aos poucos, começa a mostrar sinais que está a chegar ao fim.
À medida que nos aproximávamos do Seixal, quem conhece a região começava a identificar alguns locais familiares. A diferença é que, desta vez, eram observados de outra perspetiva, a de dentro do rio Tejo. Falamos-lhe de espaços icónicos do concelho como o Centro Náutico de Amora, a Quinta da Fidalga, a Mundet, o Fórum Cultural do Seixal e toda a frente ribeirinha.
Para fechar o passeio em grande, avistámos por fim a Praia do Seixal ou como também é conhecida, Praia do Ti João. Passou a ser assim denominada devido a um seixalense, de seu nome João, que juntamente com a sua cadela Nina todos os dias de manhã, sem falhas, fazia questão de limpar aquela zona balnear.
Para ficar a conhecer esta e outras histórias sugerimos que esteja atento ao site da Câmara Municipal do Seixal. É lá que estes passeios, que acontecem ao longo de todo o ano no estuário do Tejo, são promovidos. Segundo Carla Ribeiro, “os interessados podem inscrever-se individualmente ou em família e participar nestes passeios que também por vezes incluem outros recursos”.
As atividades são totalmente gratuitas. Aliás, o Município do Seixal é dos únicos na Margem Sul que ainda promove este tipo de iniciativas sem pedir qualquer valor associado. Por isso, pegue nos miúdos, na família ou nos amigos e embarque a bordo desta embarcação tradicional do Tejo.
De seguida, carregue na galeria para ver como foi o passeio a bordo do Bote Fragata Baía do Seixal e a visita ao Moinho de Maré de Corroios.