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O problema d’“A Pequena Sereia” não é o elenco: “Finge que a escravatura não existiu”

Quem o diz é Marcus Ryder, um influente ativista britânico. O filme também foi alvo de uma campanha negativa no IMDb.
Halle Bailey no papel de Ariel causou polémica

Lançado há uma semana, a 26 de maio, o remake de “A Pequena Sereia” continua envolto em polémica. Tudo começou com as considerações de teor racial sobre a escolha da cantora e atriz afro-americana Halle Bailey para o papel de Ariel. Agora, a nova controvérsia é motivada pela crítica à forma como o filme suaviza questões relacionadas com escravatura.

A acusação partiu de Marcus Ryder, influente ativista britânico e presidente do conselho diretivo da Real Academia de Arte Dramática do Reino Unido, após ter visto “A Pequena Sereia” com o filho de seis anos.

Apesar de elogiar a composição do elenco, Ryder considera que “os filmes para crianças não devem ignorar os períodos mais difíceis da história, apenas porque os adultos se sentem desconfortáveis a abordá-los”.

O ativista refere-se ao facto da escravatura e do tráfico humano transatlântico — que decorreu durante vários séculos — não serem temas abordados na narrativa. “O filme decorre nas Caraíbas no século XVIII. Não especifica quando, mas a julgar pelos navios, as roupas e outras referências, é durante o período da escravidão africana”, lamenta no texto.

O problema, no seu entender, tem vários cambiantes: do facto de “não haver uma única referência direta à escravatura” à decisão de colocar os habitantes das ilhas caribenhas a “viverem em harmonia racial”.

“Não ajudamos as nossas crianças ao fingirmos que a escravatura não existiu”, alerta. E aprofundou o argumento, recorrendo a uma comparação: “Colocar esta narrativa de fantasia naquele lugar e época, é, literalmente, equivalente a contar uma história de amor entre uma pessoa judia e outra não-judia na Alemanha dos anos 40 e ignorar o holocausto judeu”, escreve.

Se, por um lado, “temos obrigação de contar aos miúdos histórias incríveis para ajudar a imaginação deles a crescer”, por outro, tal não pode ser feito “ao branquear as partes mais difíceis do nosso passado histórico”, conclui.

A publicação não passou despercebida e chegou ao Twitter, onde Ryder foi alvo de repúdio por vários utilizadores. A principal crítica foi que “A Pequena Sereia” é uma história de fantasia e não necessita de apresentar rigor histórico, o que obrigou o ativista a retratar-se e a reforçar o seu agrado na escolha de uma atriz negra para o papel de Ariel.

IMDb forçado a mudar sistema de votações

Apesar do apoio de Ryder e de muitas outras pessoas ao casting de Halle Bailey, a decisão não foi consensual. Depois do YouTube ter desativado o botão de “não gosto” no trailer oficial, o site Internet Movie Database (IMDb) revelou ter alterado o seu sistema de votações aberto ao público na página do filme.

Segundo a Variety, o objetivo era evitar um fenómeno de review bombing — ou seja, quando um filme recebe uma enchente de críticas negativas feitas por utilizadores com múltiplas contas ou até por bots programados para criarem contas para esse efeito.

Desde que estreou, “A Pequena Sereia” recebeu 41 mil avaliações de utilizadores no IMDb. Apesar de ter uma pontuação média de 7.0, mais de 39 por cento dos avaliadores atribuiu uma estrela ao filme (numa escala de 1 a 10).

Tal levou o IMDb a acrescentar uma nota ao raking da votação onde se lê que o seu sistema de avaliação “verificou atividade de votação incomum”. “Para preservar a fiabilidade do nosso sistema de avaliação, foi aplicado um cálculo de avaliações alternativo”, termina a mensagem.

Apesar das mudanças que suscitaram estas polémicas, a história do filme mantém-se praticamente inalterada. Ariel é uma princesa sereia que sonha em poder conhecer a superfície e acaba por fazer um trato com Úrsula, que lhe dá um corpo de humana. Além dos temas originais, o filme conta com quatro novas composições, todos da autoria de Alan Menken e Lin-Manuel Miranda.

O elenco conta também com nomes como Melissa McCarthy, Javier Bardem e Jonah Hauer-King, entre outros.

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