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Meestre: “Quero que a minha arte e mensagem cheguem a outros países”

O artista seixalense sonha em ser reconhecido lá fora. À NiS confessa que gostava de ir a "qualquer país que o quisesse ouvir".
Ricardo Mestre participou no "The Voice Portugal" em 2017.

Começou por pisar o palco como Ricardo, mas agora todos o conhecem como Meestre. O artista seixalense traçou o seu caminho na música em 2017, quando participou no “The Voice Portugal”, tendo o seu vídeo de apresentação já ultrapassado os 16 milhões de visualizações. Atualmente, já não precisa de virar cadeiras para o ouvirem. O seu EP, “Between Words and Sound”, lançado em fevereiro de 2022, é a prova disso mesmo.

Passou de cantarolar os musicais da Disney para atuar a sério na banda de garagem que tinha com os amigos. Já pisou vários palcos, a solo e com banda mas, apesar de ter o seu trompete como melhor amigo, é sozinho que se apresenta no Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal, no dia 2 de junho, às 21 horas, com o espetáculo “As Canções da Minha Vida”.

Em entrevista à NiS, o artista e trompetista de 39 anos conta como foi pensar neste concerto e como sonha que este seja apenas um de muitos que estão para vir, dentro e fora do território nacional. E, mesmo que prefira criar as suas canções sozinho, não se importa nada de dividir o palco com grandes nomes da música. Harry Styles, Ed Sheeran, Ana Moura e Pedro Abrunhosa são alguns dos que passam na sua cabeça.

Se quiser saber mais sobre o novo espetáculo de Meestre e o seu percurso no mundo da música, leia a entrevista na íntegra.

Falta pouco mais de uma semana para atuar no Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal, com o espetáculo “As Canções da Minha Vida”. Como se está a sentir?
Estou a sentir-me bastante entusiasmado. O trabalho que está a ser feito está muito interessante, o facto de poder não só partilhar as minhas canções, como outras interessantes para mim, dando uma roupagem ao ponto de ficarem num ambiente muito parecido às minhas. Quase como se fossem minhas. É realmente um trabalho bastante gratificante e estou mesmo ansioso por poder mostrá-lo em palco. Ainda por cima aqui na minha terra.

Como é voltar a pisar o palco na sua cidade, o Seixal?
Já tinha saudades de fazê-lo, para ser sincero [risos]. E é sempre bom poder matar essas saudades. Por isso, estou super contente.

Além das suas canções, nomeadamente aquelas que integram o seu EP “Between Words and Sound”, que outras decidiu incluir no repertório?
Acabo por ser um pouco nostálgico sempre que me ligo às canções. E fiz questão de escolher algumas que, para mim, são mesmo importantes e que marcaram de certa maneira a minha vida ao longo do meu percurso. Seja ele pessoal ou emocional. O que posso dizer é que deixo um espaço para as pessoas poderem pensar nelas, assim como penso quando as canto. Quero conseguir passar essa mensagem. É um momento de reflexão e para estarmos connosco próprios. Não um momento para nos abstrairmos do mundo, mas para encontrarmos o nosso.

Se marcaram, de certa forma, o seu percurso, podemos esperar algumas das canções com que pisou o palco do “The Voice Portugal”?
Talvez, não sei [risos]. É possível, sim. Porque, realmente, houve canções no “The Voice” que me marcaram e que, obviamente, me vão acompanhar para o resto da vida. São canções que abraço, porque o que está lá escrito e dito é exatamente o que eu sinto. Não são minhas, nem fui eu que as escrevi, mas é como se fossem parte de mim.

Voltando ao início da sua carreira, mesmo antes da participação no “The Voice”, sempre soube que tinha nascido para a música ou houve um despertar mais tardio?
Houve um clique. Só a partir dos 15 anos é que comecei a ouvir música. Não posso dizer que tive uma educação musical muito forte, nem muito presente. Ou melhor, eu é que não me apercebia dela. Porque, como gostava muito de filmes da Disney e estava sempre a ouvir as canções, sabia que gostava, mas não me apercebia disso. Aos 15 anos, no ensino secundário, começámos a fazer experiências na área do teatro e algumas brincadeiras com a voz. Tinha colegas que gostavam de cantar e eu também ia para casa a cantar. Então pensei: “Eu também sei fazer isto”. Só a partir do 11.º  ano, quando conheci um grupo de amigos muito especial, em que todos eles tocavam qualquer coisa e formámos aquelas típicas bandas de garagem, é que comecei a ouvir música com outros ouvidos. Em 2012, quando fiz parte do concerto do Mika, em Lisboa, percebi que era mesmo isto que queria fazer.

Como os seus amigos tocavam vários instrumentos, e sendo professor de música, começou o seu caminho pela música por aí ou mesmo utilizando a voz como arma?
Comecei por cantar. Gostava muito de instrumentos e achava muito curioso tocar em guitarras, mas não. Só mesmo posteriormente é que comecei a dar os primeiros passos no piano e no trompete. Aí, já tinha as ferramentas para começar a escrever as minhas canções.

Apesar de também tocar piano, é mais conhecido pela sua relação com o trompete, que já admitiu ajudá-lo a melhorar a sua capacidade auditiva musical. Como é que os dois se encontraram?
Antes de ser o Meestre e de ter as minhas canções originais, fiz um último concerto para o Centro Paroquial da Amora, em que éramos uma banda filarmónica muito grande e havia dois instrumentistas de topo: um clarinete e um saxofone. Na altura, achei curioso que, quando estávamos a ensaiar, eles diziam: “Está mais alto ou está mais baixo. A afinação não está certa, tenho de mexer aqui na cabeça do instrumento”. Olhava para aquilo e pensava: “Eles têm uma capacidade auditiva espetacular”. Perguntei onde é que eles conseguiam reconhecer isso, porque eu não conseguia, devido ao facto de não ter qualquer educação musical a não ser cantar na rua, com os amigos e nos karaokes. E eles: “Ah isso é o pão nosso de cada dia. Aqui, na banda filarmónica, estamos sempre a fazer isto”. Então quis aprender também. Eles eram os dois da Sociedade Filarmónica Seixalense e eu fui lá aprender. Estive um ano a tocar trompete, o que melhorou muito a minha capacidade auditiva e comecei cantar muito melhor. Quando comecei a ter aulas de canto, os meus professores diziam-me isso. E passou de uma ponte para os meus objetivos para uma paixão. A partir daí comecei a conhecer o jazz, a tocar trompete de música ligeira. A filarmónica deu-me uma capacidade fora do vulgar e abracei o trompete. Fazia todo o sentido.

Meestre usa o trompete para ajudá-lo com a capacidade auditiva musical.

Tendo começado numa banda de garagem e já atuado numa banda filarmónica, nunca pensou fazer este caminho acompanhado?
Pode parecer um pouco egoísta, mas sempre foi difícil pensar num grupo. Sempre que tentámos, foi muito complicado. Porque eu tinha as minhas ideias e sabia exatamente o que queria fazer e tinha isso muito vincado. Havia também estilos diferentes nos meus amigos, por isso foi muito complicado criar algo sólido original. Cantar covers era sempre fácil e nós fazíamos isso diariamente, mas criar já era um processo diferente. Então, quando comecei a criar as minhas canções, percebi que partiria de mim. Obviamente que ia ter sempre músicos a acompanhar, mas todo o processo de criação e composição tinha de passar por mim e eventualmente mais alguém. Hoje em dia, com a ajuda do meu querido Rui [Saraiva], o meu produtor, acaba por ser mais fácil. Os outros músicos são pessoas que conheço e com quem gosto de trabalhar, mas não estão incluídos a 100 por cento no projeto. Vão-me acompanhando, o que também é importante, porque me dão outros feedbacks e me ajudam a desenvolver mais as ideias e o próprio conceito dos concertos.

Disse que o seu processo de criação parte de si. No que se baseia para compor as suas canções? 
Qualquer momento na minha vida, seja ir beber um café com amigos, jantar, dar uma volta ou simplesmente ter uma chamada e jogar um videojogo, é um pretexto para criar. Às vezes, basta aquela melodia começar na cabeça, a expressão ou uma frase em que penso: “Isto dava uma música incrível. Vou começar a desenvolver essa ideia”. Ando constantemente à procura de estímulos. É tentar ter o máximo de experiências possíveis, boas e naturais, e aproveitá-las para criar. Depois disso, desenvolver a ideia, criar a harmonia e, no final, refletir sobre o que se escreveu. Eu não penso: “Quero escrever sobre este tema”. Não, eu nunca sei o tema. Sei uma frase ou melodia e só no fim é que percebo o que quis dizer com aquilo.

Só depois de a canção estar terminada é que percebe o porquê de a ter escrito?
A própria canção, especialmente quando é a falar sobre mim, é um processo de descoberta. É como se aquilo fosse um espelho de alguma coisa que eu não vejo. Muitas vezes, nós agimos, pensamos, e não refletimos sobre isso. Mas a música ajuda a conhecer-me a mim também. Porque depois vejo-a escrita e parece que o inconsciente ajuda neste processo de descoberta.

Lançou o seu primeiro single, “You”, em maio de 2020. Houve muitos artistas que recorreram à música, durante os tempos de pandemia, para conseguirem sair das quatro paredes de casa. Foi o seu caso com esta canção?
Curiosamente, a canção foi escrita antes. Pouco antes. Foi num dia em que estava mais atribulado emocionalmente e pensei: “Vou para a União Seixalense escrever qualquer coisa”. Fui e saiu a “You”. Só passado algum tempo é que conheci a Metrosonic Records. Apresentei-lhes a canção, eles gostaram e foi isso que deu abertura para o início desta parceria. Acabámos a produção da canção em dezembro e estávamos a pensar lançá-la em janeiro ou fevereiro de 2020. Entretanto, apareceu a pandemia e isso travou-nos o processo. Mas todas as outras nasceram depois da pandemia.

Quando participou no “The Voice Portugal” disse já ter passado por outros concursos musicais. Quais foram?
Já tinha concorrido, sim. Quando entrei na fase “Quero ser cantor”, passei por tudo. Tentei tudo o que havia, desde castings a musicais do Filipe La Féria, a “The Voice”, “Ídolos”, “Fator X”, tudo. Só tive abertura mesmo no “The Voice Portugal” e depois fui convidado para o de Espanha, passados dois anos. 

Passou as provas cegas, as batalhas, os tira-teimas e acabou por ser eliminado na primeira gala em direto. Sempre achou que conseguia chegar tão longe na competição?
Sempre aproveitei o momento ao máximo. Muitas vezes, na produção, diziam-me: “Acabaste de passar a primeira fase. Devias estar aí a sorrir e feliz, mas estás muito sério”. Estava sério, porque estava a desfrutar do momento. Não sabia o que ia acontecer a seguir. Uma coisa é já termos chegado ao fim e termos vencido. Aí, já podemos estar à vontade, porque aquele desafio está concluído e já não podíamos ter melhor resultado. Agora, quando passamos simplesmente uma fase é uma responsabilidade acrescida para a próxima. Então, queria realmente chegar mais longe. Não tinha a certeza, porque existiam pessoas com muita qualidade. Também não dependia apenas da minha opinião, pois são milhares de pessoas a votar e os próprios mentores têm a sua estratégia. Por isso, só queria aproveitar o momento. Claro que estava lá para ganhar e para chegar mais longe, mas não pensava que conseguia. Não tinha isso em mente.

Escolheu a Marisa Liz como sua mentora, a “defensora do rock”, como a chama carinhosamente. O que aprendeu com ela que leva consigo na música?
A Marisa tem uma característica muito interessante. Ela morde as palavras, consome-as. Enquanto que eu sou uma pessoa mais ligada às melodias, a Marisa é uma pessoa que morde as palavras, e ela “obrigou-me” indiretamente, com a sua experiência e sabedoria, a olhar mais para o texto. A pensar mais na mensagem e a transmiti-la, através de todas as competências musicais e vocais que possa ter.

Disse ter o sonho de ser um artista internacional. Como é que esse caminho se constrói? Através das canções em inglês?
Quando pensei em ser um artista internacional, o objetivo era poder experienciar outros países e levar a minha música. E eu já tive oportunidade de sentir isso. Em 2018, fui a Cuba com a minha irmã e mal entrei no hotel, o senhor da receção disse: “Tu és aquele do ‘The Voice Espanha’”. Achei aquilo muito estranho, porque não percebia como é que, em Cuba, eles conseguiam ver, mas depois explicaram-me que viam muito o programa, porque era o que apanhavam mais. E foi muito bom. Não pela sensação de ser conhecido, mas sim da minha arte chegar mais longe. Foi a partir daí que percebi que apesar de gostar do meu País e de, para mim, ser o melhor do mundo, quero ir também a outros sítios e ser reconhecido. Quero que a minha arte chegue lá. Cantar em inglês não é nenhuma estratégia, simplesmente sai-me assim. É algo intuitivo e natural, também por causa das minhas influências. Mas ser um artista internacional passa pelas experiências e de poder viajar pelo mundo. Não é que não possa fazê-lo em português, porque até podia fazê-lo e continuar a querer ser um artista internacional. Temos muito bons artistas e o fado é um bom exemplo disso.

Para que países gostava de levar a sua música?
Não sei, talvez Espanha, França, Alemanha. Qualquer um que estivesse disponível e gostasse de me ouvir. Mas pelo menos os países mais pacíficos [risos]. Esses seriam realmente sítios muito interessantes para ir. Falamos da Europa, que está aqui mais próxima, mas qualquer um que me respeitasse como artista. Que não me tentasse moldar ou censurar de alguma maneira. Que me deixassem, de maneira livre, partilhar a minha mensagem, que é simples e fala sobre amor.

Já atuou no mesmo palco de Mika, abriu recentemente o concerto dos Fingertips. Infelizmente, já não pode cantar com Freddie Mercury, o seu ídolo. Com quem gostava de pisar o palco um dia?
Do ponto de vista vocal, há um artista que sigo muito, que é o Harry Styles. Mas acho que a pessoa mais próxima da minha realidade ou aquela que mais me influencia, mesmo que sejamos completamente diferentes, é o Ed Sheeran. Ele é capaz de ser o músico atual e internacional que mais respeito. Realmente poder cantar com o Ed Sheeran… Nem é só cantar, se pudesse ter uma conversa com ele, para mim já era ótimo.

E dos artistas nacionais, com quem gostava de atuar?
Gostava de ter a experiência de cantar com uma fadista, por exemplo. Mesmo que em inglês e ela em português, como o Pablo Alborán e a Carminho, em que ele canta em espanhol e ela em português [na canção “Perdóname”]. Poder cantar em inglês e existir uma fadista que cantasse comigo, como a Mariza, a Ana Moura, que são cantoras extraordinárias. O António Variações já não está presente, senão seria realmente uma pessoa com quem gostava de cantar. Mas o Jorge Palma, o Pedro Abrunhosa… O Pedro Abrunhosa, então, seria magnífico. São referências muito importantes para mim.

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